A elevação do índice de distratos já era esperada em razão do aumento do desemprego, mas essa disparada, segundo executivos do setor da construção, foi desencadeada principalmente por investidores que compraram imóveis pensando em sua valorização e, como o mercado deu uma estagnada, desistiram do negócio temendo perder dinheiro
O avanço do número de distratos nas operações de compra de imóveis novos
em todo o país fez aumentar a pressão do setor da construção para que o governo
regulamente direitos e obrigações (penalidades) para os casos de desistência do
comprador antes da entrega das chaves. O índice de cancelamentos, que não
chegava a 20% até o início de 2014, começou a crescer de forma expressiva desde
então e chegou a 43,4% no ano passado, concentrado principalmente nas compras
de imóveis com valores entre R$ 300 mil e R$ 800 mil. A justificativa das
incorporadoras para a urgência da regulação é que, com os cancelamentos em
níveis elevados e as vendas fracas, as empresas ficam sem garantias suficientes
para tomar crédito, o que acarreta atrasos em obras de novos empreendimentos.
No esforço de impulsionar o setor da construção, a equipe econômica
trabalha para anunciar ainda esta semana uma solução para o problema dos
distratos. Os detalhes ainda sendo negociados com a Secretaria Nacional do
Consumidor (Senacon), vinculada ao Ministério da Justiça, mas a ideia é fixar
um percentual entre 20% e 25% do total pago pelo comprador, que poderá ser
retido pela construtora, mais a taxa da corretagem. Já a Associação Brasileira
das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) e outras entidades do setor, que
desde o início do ano passado discutem com os ministérios do Planejamento e da
Justiça a regulamentação de regras para esses casos, têm outra proposta: multas
de 10% para os imóveis da faixa do Minha Casa Minha Vida (de até R$ 240 mil);
de 12% para as unidades habitacionais que se encaixam nas regras do Sistema
Financeiro de Habitação (SFH), ou seja, até R$ 950 mil; e de 14% para os de
alto padrão. Esses percentuais seriam aplicados sobre o valor total do imóvel.
No ano passado até novembro, cerca de 40,9 mil contratos de venda foram
cancelados por distrato, o que equivale a 43,4% do total de imóveis vendidos no
período. Na prática, a cada cem imóveis comercializados na planta, em quase 44
os consumidores não tiveram condições ou não quiseram levar os contratos de
compra adiante. A elevação do índice de distratos já era esperada em razão do
aumento do desemprego, mas essa disparada, segundo executivos do setor da
construção, foi desencadeada principalmente por investidores que compraram
imóveis pensando em sua valorização e, como o mercado deu uma estagnada,
desistiram do negócio temendo perder dinheiro.
Desproporcional: Para as construtoras, multa por atraso seria somente de 0,25%
Hoje, o comprador geralmente paga entre 25% e 30% do valor do imóvel novo
até a entrega das chaves. Os distratos ocorrem justamente antes de o comprador
receber as chaves. Por isso, na maior parte dos casos, as incorporadoras
estabelecem multas contratuais de 50% a 60% do valor já pago pelo comprador,
diz Marcelo Tapai, advogado especialista em direito imobiliário. Alegando
tratar-se de cláusula abusiva, os compradores recorrem à Justiça, cujos juízes
de primeira instância geralmente estabelecem multas menores, entre 10% e 15% do
valor já pago.
A proposta do governo prevê duas travas para a definição da quantia que as
empresas poderão reter do cliente: o valor não pode exceder 10% do valor do
contrato, nem 80% do valor pago pelo cliente. Em contrapartida, as empresas que
atrasarem a entrega da obra em mais de 180 dias poderão ser multadas em 0,25%
do valor contratado. Acima desse prazo, a multa dobra para 0,50%.
Para se ter uma ideia do impacto dessas novas regras, num contrato de R$
500 mil, por exemplo, e taxa de corretagem de 6%, se o cliente pagou R$ 50 mil
e desistiu da compra, ele terá de deixar nas mãos da empresa R$ 30 mil só de
comissão para o vendedor; sobre os R$ 20 mil restantes, seria aplicado o
percentual fixado. Desse forma, a empresa poderá ficar com R$ 35 mil, e o
comprador receberá de volta R$ 15 mil. O valor retido está abaixo dos 10% do
valor do imóvel e dos 80% do valor desembolsado.
Os clientes do Minha Casa Minha Vida não deverão ser afetados. A proposta
de regulamentação prevê tratamento diferenciado por tipo de imóvel, se é
residencial ou comercial.
Vítimas do próprio mercado que criaram
Para as incorporadoras, a regulamentação dará maior previsibilidade às
empresas do setor e evitará disputas na Justiça, que são recorrentes. Claudio
Carvalho, vice-presidente da Abrainc, explica que esses cancelamentos reduzem a
previsão de fluxo de recursos para as construtoras, o que torna mais difícil o
acesso ao crédito.
— Se as vendas não estão dentro do cronograma, os bancos começam a parar
com o crédito à produção. A concessão de crédito está muito mais restrita, e
isso pode causar paralisação de obra nas construtoras que não têm caixa próprio
disponível — diz.
Flavio Amary, presidente do Sindicato da Habitação de São Paulo
(Secovi-SP), afirma que os distratos causam um desequilíbrio no mercado, pois,
além dos gastos que as incorporadoras já tiveram, como os de corretagem, o
fluxo de caixa do projeto é afetado, o que pode prejudicar as outras pessoas
que compraram unidades no mesmo empreendimento.
— Muitos investidores desistem do imóvel porque não ocorreu a valorização
esperada. Isso não é justo e não acontece em outros setores. É uma decisão
unilateral do comprador, tomada quando ele percebe que o negócio deixou de ser
bom para ele — disse.
Na visão das incorporadoras, deve ser considerado o valor total porque os
custos de venda, como corretagem e divulgação do empreendimento, incorrem sobre
esse valor. Eles argumentam ainda que a prática em outros países é uma multa de
100% do valor já pago. O acordo estava próximo, mas os órgãos de defesa do
consumidor começaram a questionar a proposta, temendo que a nova regra seja
muito desfavorável ao mutuário.
Ministério Público é contra
Para o promotor Sidney Rosa, do Ministério Público do Rio de Janeiro
(MP-RJ), o grande problema de uma regra que fixe como multa um percentual do
valor do imóvel é que, em alguns casos, isso pode representar até 100% do que
já foi pago pelo comprador.
— A crise econômica não atinge apenas as empresas, mas especialmente os
consumidores. Não se pode pretender transferir a eles, cuja situação financeira
já chegou ao ponto de devolver o imóvel, todo o risco do negócio e os ônus
correspondentes.
Especialista em direito imobiliário, o advogado Hamilton Quirino lembra
que uma lei nova não poderá retroagir aos contratos anteriores, sendo válida,
apenas, a partir do início de sua vigência.
Apesar das dificuldades e da falta de acordo, o setor da construção espera
um aquecimento a partir do segundo semestre deste ano. Por essa razão, as
incorporadoras já começam a apresentar projetos de novos empreendimentos ao
bancos, para avaliar as condições de crédito para a produção. Ter uma regra
mais clara de distratos também vai ajudar nesse ponto, segundo Fabrizio
Ianelli, superintendente de crédito imobiliário do Santander. A venda das
unidades e o andamento da obra são essenciais para o acesso ao crédito e a
liberação de recursos — que é feita gradualmente, de acordo com o ritmo da
construção e do ritmo de vendas líquidas — já descontando os distratos do
empreendimento.
— Quando o distrato sobe, o nível de comercialização não sobe. Então, isso
interfere nas aprovações — comentou Ianelli, afirmando que o ano passado foi o
mais crítico em distratos, afetando as liberações para as construtoras, que
agora tentam reduzir seus estoques.
Para o vice-presidente do Sinduscon, Odair Senra, a redução dos juros, que
teve início no fim do ano passado, e a estabilização do índice de desemprego, a
partir de meados do ano, devem dar impulso ao mercado imobiliário. Com mais
vendas, o nível de distratos pode cair, mas o dirigente defende que alguma
regulamentação é necessária para evitar desequilíbrios para o incorporador e
para o empreendimento.
(O Globo - Economia - 08/02/2017)
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A propina vai correr solta para essa proposta ser aprovada.
ResponderExcluirO povo tem que ficar esperto. Mas infelizmente, vão aprender tomando lambada no lombo.
A propina não vai. JA FOI !!! Estão querendo assaltar o bolso dos consumidores meu caro. É o mesmo que está ocorrendo com a proposta de perdão da divida das Teles, defendida pelo bandido Kassab. Com toda essa podridão que estamos só tem uma saída: ler, estudar, ficar ligado no que está acontecendo pra não ser vitima dessas armadilhas
ExcluirIsso é otimo para os atuais consumidores, tendo em vista que os especuladores não irão entrar mais nessa roubada e a população não tem grana pra comprar. Permaneceremos igual estamos hoje, com mercado parado precisando abaixar o preço pra conseguir 1 venda. O conluio entre especuladores, construtoras, imobiliárias e bancos acabou agora é cada um por si.
ResponderExcluirAo meu ver a regulamentação dos distratos é a primeira etapa para a redução dos preços dos imóveis. Isso porque acho que as construtoras não estão dando descontos expressivos aos novos usuários com medo dos que já assinaram seus contratos bolhudos distrarem em vista do preço bem mais baixo do contrato novo.
ResponderExcluirMais uma matéria estilo GLOBO "comprada". Os pseudo investidores tem que levar ferro mesmo. As construtoras da mesma forma. Querem terminar esse problema? É simples, vendam os imóveis apenas quando estiverem prontos assim como é feito em outros países corretos.
ResponderExcluirComo assim problemas com distratos? Os corretores não estavam vendendo assim que voltava para a construtora? Será que era mentira? Não ne...imóvel aumenta 30% ao ano....como esse povo cai nessa?
ResponderExcluirQuando a gente diz que essa bosta de venda na planta tem quer ser proibida, nós chamam de extremistas. Ah, inocentes!
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